OPÇÃO DE EXTENSÃO DO PRAZO PARA SANAR VÍCIOS APRESENTADOS EM PRODUTOS COMERCIALIZADOS POR PEQUENOS E MÉDIOS COMERCIANTES

De como o artigo 18, § 2°, do Código de Defesa do Consumidor facilita a solução das problemáticas enfrentadas pelo Comerciante fornecedor

No mês passado, o Código de Defesa do Consumidor – “CDC”, completou 30 anos de existência, vigente desde 11 de março de 1991, possui como foco as relações contratuais e extracontratuais existentes envolvendo o Consumidor e a pessoa do Fornecedor.

Serviu e continua servindo de parâmetro regulatório de uma infinidade de situações que fomentam o mercado financeiro e a própria economia do País.

Apesar de sua denominação “Defesa do Consumidor”, cujo escopo principal é a defesa da parte vulnerável da relação contratual, a legislação abarca também os deveres e, quase esquecidos, direitos do fornecedor – que são aquelas personalidades elencadas no artigo 3º do Código em comento.

Neste sentido, este artigo busca prestar auxílio aos comerciantes em situações pontuais pela qual venham a se deparar com eventuais reclamações apresentadas pelos seus consumidores, especialmente envolvendo a comercialização de produtos.

Como dito, neste artigo trataremos apenas dos “problemas” atinentes ao chamado vício no produto (que restringe-se ao uso e funcionamento, não atingindo, portanto, a integridade física do consumidor).

Conforme previsão do artigo 18 do CDC:

“Os fornecedores de produtos de consumo duráveis ou não duráveis respondem solidariamente pelos vícios de qualidade ou quantidade que os tornem impróprios ou inadequados ao consumo a que se destinam ou lhes diminuam o valor, assim como por aqueles decorrentes da disparidade, com a indicações constantes do recipiente, da embalagem, rotulagem ou mensagem publicitária, respeitadas as variações decorrentes de sua natureza, podendo o consumidor exigir a substituição das partes viciada”.

O parágrafo primeiro do mesmo artigo determina que:

“Não sendo o vício sanado no prazo máximo de trinta dias, pode o consumidor exigir, alternativamente e à sua escolha: I – a substituição do produto por outro da mesma espécie, em perfeitas condições de uso; II – a restituição imediata da quantia paga, monetariamente atualizada, sem prejuízo de eventuais perdas e danos; III – o abatimento proporcional do preço”.

Em linhas gerais, dispõe a legislação de um prazo para que o fornecedor tenha a oportunidade de sanar o vício apresentado pelo consumidor que, conforme regra geral, consiste em 30 (trinta) dias, a contar do recebimento do item.

Neste lapso temporal, o Fornecedor receberá o produto – que supostamente apresentou vício em sua fabricação, com a finalidade de envio do mesmo para as denominas “empresas autorizadas” (que nada mais são do prestadoras de serviço especializadas, muitas das vezes ligadas ao próprio fabricante, e que realizam a análise e o reparo necessário nos itens que apresentaram problema) ou aos cuidados do próprio fabricante, que por sua vez exercerá a análise pormenorizada sobre a existência, ou não, de vícios estruturas de fabricação.

Sobre o prazo de reparo (que em muitos dos casos pode extrapolar os 30 dias previstos no art. 18 do CDC), indica-se que o citado problema guarda relação com as solicitações de garantia direcionadas aos pequenos e médios comerciantes, vez que, na grande maioria destes casos, o Consumidor direciona sua reclamação ao estabelecimento em que o produto fora adquirido, sem prejuízo de não ser esse fornecedor quem eventualmente tenha fabricado o bem (não detém o pleno conhecimento científico para eventuais análises a serem realizadas para o fornecimento ou não da garantia).

Na prática, o Comerciante apenas adquire esses produtos de terceiros (no caso o próprio fabricante ou distribuidor) para disponibilizá-los para comércio em seu estabelecimento, não tendo qualquer participação em seu desenvolvimento estrutural. Porém, na existência de eventual vício, este fato, por si só, não serve a justificar o afastamento de sua responsabilidade (solidária ao fabricante).

Desta forma, tem-se que o prazo o prazo previsto na legislação (trinta dias) acaba não sendo suficiente para apresentar uma solução ao problema apresentado pelo Consumidor, haja vista que somente o tramite de o envio do produto para o Fabricante (que muitas das vezes se encontra sediado em outros Estados) pode tomar quase metade deste prazo (trinta dias), ainda mais se levar em consideração o sistema de correios e transportes brasileiros, que é demasiadamente precário.

Com isso, uma solução a ser apresentada para estes casos se faz presente na extensão do prazo para análise e fornecimento ou não de garantia, conforme previsão do artigo 18, § 2°, do Código de Defesa do Consumidor, veja-se:

“Poderão as partes convencionar a redução ou ampliação do prazo previsto no parágrafo anterior, não podendo ser inferior a sete nem superior a cento e oitenta dias. Nos contratos de adesão, a cláusula de prazo deverá ser convencionada em separado, por meio de manifestação expressa do consumidor”.

Como visto, a prorrogação do prazo de entrega é perfeitamente viável para os casos em que o pequeno ou médio comerciante, ciente do tempo que leva todo o tramite relativo ao envio do item à garantia, se vê diante de uma situação em que poderá ser prejudicado pelo não cumprimento do prazo (demanda judicial).

Contudo, torna-se extremamente imprescindível que o comerciante elabore um termo em apartado no ato da venda (ou até mesmo cláusula expressa no contrato), onde conste a informação de que, em eventual acionamento do direito de garantia, o prazo poderá se estender em até 180 (cento e oitenta) dias. Consigna-se que ato deve ser objeto de concordância expressa por parte do consumidor, que assinará o termo dando plena ciência de que concorda com os termos apresentados, dando-se, desta forma, efetivo cumprimento ao dever de informação exigido pela legislação:

Art. 31. A oferta e apresentação de produtos ou serviços devem assegurar informações corretas, claras, precisas, ostensivas e em língua portuguesa sobre suas características, qualidades, quantidade, composição, preço, garantia, prazos de validade e origem, entre outros dados, bem como sobre os riscos que apresentam à saúde e segurança dos consumidores.

Note-se, portanto, que a legislação, ainda que de forma muito tímida, prevê a possibilidade de se evitar eventuais ocorrências de falha na prestação de serviço (descaso no pós-venda), garantindo direito ao fornecedor (comerciante) de convencionar a extensão do prazo de reparo do produto.

Taker Matheus Felix Igarashi

Advogado e sócio do Escritório Severo Advogados Associados, pós-graduado em Direito Civil, Processual Civil e especialista em Direito de Consumo.

A IMPORTÂNCIA DAS REDES SOCIAIS (WHATSAPP) COMO FERRAMENTA DE INFORMAÇÃO PARA OS FORNECEDORES DE PRODUTOS OU SERVIÇOS NO PROCESSO DE FORNECIMENTO DE GARANTIA

Em tempos de facilitação e expansão dos meios de comunicações digitais, as redes sociais se tornaram uma grande aliada aos fornecedores, especialmente no que toca ao cumprimento do dever de informação previsto no artigo 6º, III, do CDC[1].

 

O artigo 6º do Código de Defesa do Consumidor, em seu inciso III, disciplina ser direito básico do Consumidor a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços postos no mercado de consumo.

Em sentido convergente, o artigo 31[2] do CDC dispõe ser dever do fornecedor assegurar que o Consumidor disponha de informações corretas, claras precisas, ostensivas e em língua portuguesa dos produtos e serviços que adquire, ou que venha a usufruir.

Observa-se da leitura combinada destes dois artigos que de um lado, o consumidor possui o direito de ser informado de todas as peculiaridades que envolvam a aquisição de determinado bem ou serviço e, por outro lado, que o fornecedor é obrigado ao fornecimento destas informações.

Apesar das disposições legais serem de simples compreensão, a realidade é que a matéria representa uma grande problemática, especialmente no que diz respeito aos processos de fornecimento e análise de garantia a serem realizados por parte do fornecedor (neste artigo será tratado apenas questões relativas ao vício no produto – Art. 18 do CDC[3]).

Extrai-se do o último relatório[4] apresentado pelo Conselho Nacional de Justiça, que a matéria “Responsabilidade do Fornecedor/Indenização por Dano Moral” representa um dos cinco assuntos com mais quantitativos de processo em todas as instâncias da Justiça Estadual, fato que comprova a ocorrência de evidente falha nestas relações.

É preciso insistir no fato de que em grande parte destes casos (ou processos), a discussão tem como cerne principal questões dizentes à ausência de dever de informação no que compreende ao chamado “procedimento de garantia”, que em linhas gerais é um dever de conduta a ser adotada pelo Fornecedor e que relacionado ao atendimento e ao devido encaminhamento de peças “falhadas” para análise técnica.

Com o advento das redes sociais, especialmente o WhatsApp, não se pode mais admitir a possibilidade de o Fornecedor alegar dificuldades no que diz respeito à comunicação de todos os tramites do processo de garantia dos produtos que coloca no mercado, porquanto a legislação não veda o uso deste tipo de ferramenta como forma de comunicação, que se enquadra, inclusive, como transmissão de resposta inequívoca, vide artigo 26, § 2°, I do CDC[5].

De acordo com Fernando Paiva, editor do Mobile Time[6], “O WhatsApp segue instalado nos smartphones de 99% dos brasileiros, mas a novidade é a quantidade de entrevistados que afirmam abri-lo todos os dias: subiu de 93% para 95% em apenas seis meses, fruto do isolamento social causado pela pandemia. Se levarmos em conta quem garantiu abri-lo “quase todos os dias”, esse montante sobe para 99%; ou seja, quase todos os brasileiros abrem o WhatsApp com uma frequência praticamente diária”.

Anote-se que o dever de informação guarda ligação umbilical com o denominado princípio da boa-fé nas relações contratuais de consumo as quais inseridas no Código de Defesa do Consumidor.

Em sua obra, “Manual de Direito do Consumidor”[7], os doutrinadores Flávio Tartuce e Daniel Amorim Assumpção Neves expressam que “Da atuação Concreta das partes na relação contratual é que surge o conceito de boa-fé objetiva”, merecendo destaque “o dever de cuidado, dever de respeito, o dever de lealdade, o dever de probidade, o dever de informar, o dever de transparência, o dever de agir honestamente e com razoabilidade”.

Logo, ao diligenciar de modo ativo nestes casos, ou seja, com o envio de informações que levam o Consumidor a ter conhecimento dos prazos, tramites e eventuais atrasos no procedimento, o Fornecedor pratica conduta pautada na boa-fé, dando-se, assim, cumprimento efetivo ao seu dever contratual para com o Consumidor (parte com vulnerabilidade informacional).

Neste sentido vale lembrar que “A garantia é um instrumento que, quando bem utilizado, consolida a imagem da empresa no mercado, visto que legalmente ela passa a garantir seus produtos[8].”, e que o descaso no pós venda[9] é capaz de, por si só, gerar dever de responsabilidade objetiva do fornecedor (ensejando-se condenações para reparação de eventuais danos morais).

Por tudo isso, utilizar-se das ferramentas tecnológicas disponíveis é quase um dever de conduta de um Fornecedor que zela pela boa imagem de sua empresa, e que, igualmente, se preocupa com a redução de seu passivo em demandas judiciais relativas a falha no pós venda de seus produtos (aqui inserido o procedimento de garantia).

 

Taker Matheus Felix Igarashi

Advogado e Sócio do Escritório Severo Advogados Associados, pós-graduado em Direito Civil, Processual Civil e especialista em Direito de Consumo.

[1]   Art. 6º São direitos básicos do consumidor: III – a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade, tributos incidentes e preço, bem como sobre os riscos que apresentem; (Redação dada pela Lei nº 12.741, de 2012)

[2] Art. 31. A oferta e apresentação de produtos ou serviços devem assegurar informações corretas, claras, precisas, ostensivas e em língua portuguesa sobre suas características, qualidades, quantidade, composição, preço, garantia, prazos de validade e origem, entre outros dados, bem como sobre os riscos que apresentam à saúde e segurança dos consumidores.

[3] Art. 18. Os fornecedores de produtos de consumo duráveis ou não duráveis respondem solidariamente pelos vícios de qualidade ou quantidade que os tornem impróprios ou inadequados ao consumo a que se destinam ou lhes diminuam o valor, assim como por aqueles decorrentes da disparidade, com a indicações constantes do recipiente, da embalagem, rotulagem ou mensagem publicitária, respeitadas as variações decorrentes de sua natureza, podendo o consumidor exigir a substituição das partes viciadas.

[4] https://www.cnj.jus.br/wp-content/uploads/2020/08/WEB-V3-Justi%C3%A7a-em-N%C3%BAmeros-2020-atualizado-em-25-08-2020.pdf

[5] Art. 26. O direito de reclamar pelos vícios aparentes ou de fácil constatação caduca em: I – a reclamação comprovadamente formulada pelo consumidor perante o fornecedor de produtos e serviços até a resposta negativa correspondente, que deve ser transmitida de forma inequívoca;

[6] https://www.mobiletime.com.br/noticias/03/09/2020/95-dos-usuarios-do-whatsapp-acessam-o-aplicativo-todo-dia/

[7] Tartuce, Flávio. Manual de direito do consumidor: direito material e processual/ Flávio Tartuce, Daniel Amorim Assumpção Neves. – 6. Ed. rev. Atual e Ampl. – Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: MÉTODO, 2017.

[8] http://www.vdo.com.br/media/746664/manual-garantia.pdf

[9] TJ-PR – RI: 00070454220178160033 PR 0007045-42.2017.8.16.0033 (Acórdão), Relator: Juíza Melissa de Azevedo Olivas, Data de Julgamento: 26/11/2018, 1ª Turma Recursal, Data de Publicação: 27/11/2018, TJ-PR – RI: 00093128520168160044 PR 0009312-85.2016.8.16.0044 (Acórdão), Relator: Juiz Nestario da Silva Queiroz, Data de Julgamento: 25/04/2018, 1ª Turma Recursal, Data de Publicação: 25/04/2018, TJ-PR – RI: 000421471201481600180 PR 0004214-71.2014.8.16.0018/0 (Acórdão), Relator: Renata Ribeiro Bau, Data de Julgamento: 09/04/2015, 1ª Turma Recursal, Data de Publicação: 17/04/2015.

BREVES CONSIDERAÇÕES SOBRE A INTERPOSIÇÃO DE AGRAVO DE INSTRUMENTO CONTRA DECISÃO INTERLOCUTÓRIA QUE INDEFERE A INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA NAS RELAÇÕES DE CONSUMO.

De como a hipótese do art. 6º, VII do CDC não se difere daquela prevista no art. 373, §1º do CPC para fins de interposição do Recurso de Agravo de Instrumento (art. 1.015, XI do CPC). Considerações sobre o atual entendimento da Corte de Precedentes.

Com a publicação do “Novo” Código de Processo Civil (em vigor desde 16 de março de 2.015), as regras de interposição e conhecimento do Recurso de Agravo de Instrumento foram significativamente alteradas, optando o legislador, em pretensão de uma sonhada celeridade (art. 4º, CPC[1]), por enumerar, taxativamente, as hipóteses de cabimento da medida.

Esta opção, ao contrário do que se pretendeu, criou uma enorme divisão por parte doutrina especializada no que diz respeito ao procedimento previsto no Código de Processo Civil, e, principalmente – e este será o foco do presente artigo, alterou substancialmente o entendimento jurisprudencial acerca da questão.

Na tentativa de dirimir a controvérsia que deu origem às discussões sobre o tema, no dia 05 de dezembro de 2.018, o Superior Tribunal de Justiça, através do julgamento dos REsps nº 1.696.396 e 1.704.520, pôs fim definitivo na denominada “taxatividade” do artigo 1.015 do CPC, de modo que consolidou-se a posição anterior, acerca da mitigação dessa taxatividade, quando os temas a serem submetidos ao agravo não puderem aguardar o apelo, sob pena de inutilidade do mesmo.

No entanto, a questão continua sendo objeto de divergência nos mais variados Tribunais do País, que, através de jurisprudência defensiva, reiteradas vezes denegam seguimento ao recurso sob o fundamento (muitas das vezes inadequado) da suposta taxatividade do artigo 1.015 do CPC[2].

No que diz respeito ao Código de Defesa do Consumidor (foco deste artigo), observa-se, ainda, uma grande oposição, por parte da citada jurisprudência, de que a regra de distribuição prevista no art. 373, §1º do CPC[3] guarda umbilical relação com a hipótese do art. 6º, VII do CDC[4] (inversão ope legis), o que, consequentemente, atrairia a aplicação do art. 1.015, XI do CPC (cabimento decorrente de decisão que indefere a redistribuição do ônus da prova).

Como já citado, por se tratar de uma regra de procedimento, a inversão prevista no art. 6º, VII do CDC não poderia ser postergada para análise em Sentença, o que afastaria, por si só, qualquer argumentação no sentido de que a matéria seria recorrível em preliminar de Apelação (art. 1.009, §1º, CPC[5]).

Sobre a questão, o Superior Tribunal de Justiça, através de Decisão Monocrática[6] do Ilustre Ministro Salomão, assim indicou: “esta Corte Superior tem entendido que é cabível o agravo de instrumento tanto nas hipóteses de distribuição judicial do ônus da prova, como nas situações em que haja a inversão autorizada pelo legislador (art. 6º, VIII, do CDC, combinado com art. 373, § 1º, primeira parte, do CPC/2015), ou ainda com base na cláusula aberta de distribuição dinâmica do art. 373, § 1º, segunda parte, do CPC/2015, tratando-se de regras de instrução com as quais o julgador deve se preocupar na fase instrutória”.

No mesmo sentido a posição adotada pela Ilustre Ministra Nancy Andrighi[7]: “O art. 373, §1º, do CPC/15, contempla duas regras jurídicas distintas, ambas criadas para excepcionar à regra geral, sendo que a primeira diz respeito à atribuição do ônus da prova, pelo juiz, em hipóteses previstas em lei, de que é exemplo a inversão do ônus da prova prevista no art. 6º, VIII, do CDC, e a segunda diz respeito à teoria da distribuição dinâmica do ônus da prova, incidente a partir de peculiaridades da causa que se relacionem com a impossibilidade ou com a excessiva dificuldade de se desvencilhar do ônus estaticamente distribuído ou, ainda, com a maior facilidade de obtenção da prova do fato contrário. 7- Embora ontologicamente distintas, a distribuição dinâmica e a inversão do ônus têm em comum o fato de excepcionarem a regra geral do art. 373, I e II, do CPC/15, de terem sido criadas para superar dificuldades de natureza econômica ou técnica e para buscar a maior justiça possível na decisão de mérito e de se tratarem de regras de instrução que devem ser implementadas antes da sentença, a fim de que não haja surpresa à parte que recebe o ônus no curso do processo e também para que possa a parte se desincumbir do ônus recebido. 8- Nesse cenário, é cabível a impugnação imediata da decisão interlocutória que verse sobre quaisquer das exceções mencionadas no art. 373, §1º, do CPC/15, pois somente assim haverá a oportunidade de a parte que recebe o ônus da prova no curso do processo dele se desvencilhar, seja pela possibilidade de provar, seja ainda para demonstrar que não pode ou que não deve provar, como, por exemplo, nas hipóteses de prova diabólica reversa ou de prova duplamente diabólica.”

Portanto, considerando-se o entendimento da Corte de Precedentes – que admite a utilização do recurso para o caso indicado, não se poderia admitir a permanência de decisões defensivas que denegam seguimento ao Recurso de Agravo de instrumento interposto contra decisões que indeferem a redistribuição do ônus da prova nos casos abrangidos pelo Código de Defesa do Consumidor (decisão interlocutória de saneamento processual), porquanto sua postergação para debate em sede de recurso de Apelação, na maioria dos casos, ensejam graves prejuízos à parte vulnerável (em alguns casos hipossuficiente) da relação.

Taker Matheus Felix Igarashi

 

Advogado e Sócio do Escritório Severo Advogados Associados, pós-graduado em Direito Civil, Processual Civil e especialista  em Direito de Consumo.

[1] Art. 4º As partes têm o direito de obter em prazo razoável a solução integral do mérito, incluída a atividade satisfativa.

[2] Art. 1.015. Cabe agravo de instrumento contra as decisões interlocutórias que versarem sobre: XI – redistribuição do ônus da prova nos termos do art. 373, § 1º

[3] Art. 373. O ônus da prova incumbe: I – ao autor, quanto ao fato constitutivo de seu direito; II – ao réu, quanto à existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor.  § 1º Nos casos previstos em lei ou diante de peculiaridades da causa relacionadas à impossibilidade ou à excessiva dificuldade de cumprir o encargo nos termos do caput ou à maior facilidade de obtenção da prova do fato contrário, poderá o juiz atribuir o ônus da prova de modo diverso, desde que o faça por decisão fundamentada, caso em que deverá dar à parte a oportunidade de se desincumbir do ônus que lhe foi atribuído.

[4]  Art. 6º São direitos básicos do consumidor: VIII – a facilitação da defesa de seus direitos, inclusive com a inversão do ônus da prova, a seu favor, no processo civil, quando, a critério do juiz, for verossímil a alegação ou quando for ele hipossuficiente, segundo as regras ordinárias de experiências;

[5]  Art. 1.009. Da sentença cabe apelação.§ 1º As questões resolvidas na fase de conhecimento, se a decisão a seu respeito não comportar agravo de instrumento, não são cobertas pela preclusão e devem ser suscitadas em preliminar de apelação, eventualmente interposta contra a decisão final, ou nas contrarrazões.

[6] (STJ. Decisão monocrática 1827689. Processo nº 2019/0213084-1;. Relator (a): Luis Felipe Salomão;.

Data do julgamento: 03/03/2020. Data de publicação: 03/03/2020).

[7] REsp 1.729.110/CE, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 02/04/2019, DJe 04/04/2019